BlogCompliance no Terceiro Setor

Depois do caso do CEO da Astronomer no show do Coldplay, a recente demissão do então CEO da Nestlé, após a descoberta de um relacionamento com uma subordinada direta, trouxe à tona um tema essencial para as organizações: a gestão de conflitos de interesse e o papel da ética nas relações de trabalho.

Esses episódios mostram que, mesmo em cargos de alta liderança, ninguém está isento das regras internas. Em ambas as empresas, a decisão pela demissão dos seus CEOs evidencia como condutas individuais podem afetar a governança, a reputação e a confiança de uma companhia.

O que está em jogo?

Relacionamentos afetivos no ambiente de trabalho não são, por si só, ilegais no Brasil. A Constituição Federal e a CLT garantem o direito à vida privada e à intimidade. No entanto, quando envolvem hierarquia direta ou impacto na tomada de decisões, podem configurar conflito de interesses e comprometer a imparcialidade profissional.

No caso da Nestlé, a regra era clara: o Código de Conduta proibia relacionamentos hierárquicos. A razão é simples: nesse tipo de vínculo, pode haver favorecimento, quebra de isonomia e até risco de retaliação para outras pessoas da equipe.

O papel do compliance

Empresas que prezam por ética, transparência e credibilidade precisam ter políticas claras para prevenir situações que possam gerar dúvidas sobre a imparcialidade de seus líderes e colaboradores.

Um programa de compliance efetivo deve contemplar:

  • Política de conflitos de interesse: definindo o que caracteriza a situação, como deve ser reportada e de que forma será tratada.
  • Código de ética: com regras objetivas sobre relacionamentos hierárquicos, presentes, favores e demais situações sensíveis.
  • Canais de denúncia: que permitam reportar possíveis violações de forma segura e confidencial.
  • Treinamentos contínuos: para reforçar a importância da ética no dia a dia e esclarecer dúvidas dos colaboradores.

O desafio dos relacionamentos entre colegas

No Brasil, a empresa não pode proibir que seus colaboradores mantenham relacionamentos pessoais, mas pode estabelecer limites no ambiente profissional., como por exemplo:

  • Evitar que pessoas em relacionamento direto ocupem cargos de subordinação.
  • Transferir um dos colaboradores de setor ou área, quando necessário.
  • Regular comportamentos visíveis no espaço de trabalho, como demonstrações excessivas de intimidade.

Essas medidas não buscam restringir a vida pessoal, mas sim preservar o ambiente organizacional, a produtividade e a reputação da companhia.

Ética como guia

Mais do que regras, esses episódios mostram a necessidade de cultivar uma cultura de integridade e ética. Quando colaboradores entendem que suas escolhas têm impacto coletivo, a tendência é que atuem de forma mais responsável.

A ética corporativa não se resume a evitar penalidades legais, mas a manter relações entre colegas, líderes e com a sociedade de forma ética.

Reflexos para a liderança

As substituições dos CEOs certamente foram em busca de garantir continuidade e estabilidade para as empresas. Mas a demissão de um líder desse nível também envia uma mensagem poderosa: a liderança deve ser exemplo.

Quando quem ocupa a posição mais alta da organização desrespeita o código interno, há risco de enfraquecimento da cultura ética e desmotivação dos demais colaboradores. As respostas firmes e tempestivas da Nestlé e da Astronomer reforçam que a governança não pode ser seletiva.

Conclusão

Esses episódios são lembrete de que compliance e ética não são apenas formalidades, mas fundamentos da sustentabilidade e longevidade empresarial.

Relacionamentos no trabalho podem acontecer, mas devem ser tratados com clareza, responsabilidade e transparência para evitar conflitos de interesse. Para empresas, cabe reforçar regras internas e investir na criação de uma cultura ética sólida. Para colaboradores, cabe agir com consciência sobre o impacto que escolhas pessoais podem ter no coletivo.

No fim das contas, o recado é claro: compliance é sobre confiança e ela precisa ser cultivada todos os dias.