Quando falamos em Programa de Compliance, automaticamente nos vem à mente os seus 10 pilares, dentre os quais o Código de Conduta e Políticas, documentos adotados pela empresa a fim de manter a conformidade com as leis, a cultura e a ética.
Neste contexto, quando pensamos em sociedades empresárias, associações, fundações e demais pessoas jurídicas de forma geral, é comum vincular a aplicação de tais instrumentos a seus sócios, colaboradores e parceiros de negócios. Afinal, seriam estes os indivíduos que poderiam comprometer a reputação e a saúde financeira da organização. Mas será mesmo que apenas aqueles sujeitos com um contrato assinado com a pessoa jurídica são responsáveis pela imagem desta última?
Como todo profissional da área sabe, um Programa de Compliance não é “copia e cola”. Há de se analisar as peculiaridades de cada negócio ao se fazer a análise de riscos e às vezes, indivíduos externos ao negócio podem sim influenciar no prestígio e no futuro financeiro daquele empreendimento.
Um bom exemplo disso são os Clubes de Futebol, tão carentes em Governança. Ocorre que, além de seus contratados, os seus torcedores são elemento crucial para um efetivo Programa de Compliance, visto que fazem parte do Clube na medida em que as suas ações influenciam diretamente tanto no ambiente esportivo como um todo, como no próprio Clube, apesar de não serem colaboradores do Clube.
Isso porque, o mal comportamento do torcedor em um estádio de futebol ou mesmo fora deste, com atos de vandalismo e agressões físicas e verbais, abala a reputação do Clube e afasta possíveis investidores. Ademais, a depender do local e proporção dessas ações, os Órgãos dirigentes do futebol e a Justiça Desportiva podem estabelecer multas, exigindo um deslocamento de capital que poderia ser investido na compra de jogadores, pagamento de salários, melhorias internas, entre outros.
Do mesmo modo, os Clubes ainda podem ser submetidos a sanções administrativas com a proibição da presença da torcida em jogos e campeonatos, o que pode afetar diretamente o psicológico dos atletas e consequentemente a boa performance no jogo em questão. Este tipo de problema já foi inclusive relatado por jogadores de diversos clubes neste momento de pandemia do covid-19, quando foram autorizados a jogar, mas sem a participação da torcida.
Por último, mas não menos importante, atitudes como as relatadas possuem ainda a capacidade de destruir patrimônio privado, atingir a honra das pessoas, causar danos físicos e psíquicos, bem como desestabilizar a harmonia local, inclusive infringindo medo aos demais cidadãos ao redor, dentre eles crianças e idosos.
Desse modo, é essencial que os torcedores dos Clubes de Futebol sejam parte do Programa de Compliance, com a elaboração de instrumentos de aculturamento por meio da conscientização do torcedor sobre as consequências reais de suas atitudes, para o Clube e a sociedade em geral.
Uma forma de fazer isso é com a idealização de um Manual do Torcedor, uma ferramenta inovadora e diferenciada para a área do desporto que visa atender a esta especificidade tão diferente da maioria dos negócios.
E essa preocupação não apenas com o Clube, mas também com a coletividade, dentro de um Programa de Compliance, faz com que o ideal seja que tal instrumento abarque não apenas atitudes antiéticas e ilegais ocorridas dentro do estágio, mas também aquelas fora do estádio, com as devidas investigações e eventuais punições aos torcedores que forem identificados violando o Manual e as legislações locais.
Como podemos ver, os riscos de cada negócio são diferentes e assim devemos sempre estar atentos a estes fatores que fogem do comum, para que o nosso Programa de Compliance não seja incompleto ou mesmo ineficaz. Os Clubes de Futebol são apenas um dentre tantos outros casos em existem por aí com peculiaridades diferenciadas.