Por Danilo Maeda*

O IBGC (Instituto Brasileiro de Governança Corporativa) lançou recentemente a sexta edição do Código das Melhores Práticas de Governança Corporativa. O documento é resultado de um longo processo de revisão e traz mudanças consideráveis em relação à versão anterior, de 2015. Sua relevância está no fato de ser basicamente uma “bíblia” da governança brasileira, com recomendações e diretrizes seguidas à risca (ou por vezes nem tanto) pelas pessoas que tomam decisões nas principais empresas do País.

Outro fator relevante para o tema da governança é que sem boas práticas desse tipo, as estratégias ESG podem tornar-se metas listas de tarefas sem valor estratégico real para a empresa e suas partes interessadas, com potencial elevado de minguarem ao longo do tempo. É fundamental estabelecer mecanismos que façam a gestão contínua da e para a sustentabilidade, trazendo a preocupação com o longo prazo para as decisões cotidianas.

Governança é sustentabilidade

Entre as mudanças, destaca-se o próprio conceito-base do manual. No novo texto, o IBGC continua a definir governança corporativa como um “sistema formado por princípios, regras, estruturas e processos pelo qual as organizações são dirigidas e monitoradas”, mas adiciona que o objetivo deste sistema é a “geração de valor sustentável para a organização, para seus sócios e para a sociedade em geral”. Não é por acaso que a segunda parte da definição se parece bastante com o que chamamos em sustentabilidade de criação de valor compartilhado.

Além disso, a nova definição trata da “busca pelo equilíbrio entre os interesses de todas as partes, contribuindo positivamente para a sociedade e para o meio ambiente”, o que reforça o papel central do engajamento de stakeholders não só nas estratégias ESG mas nos próprios mecanismos de funcionamento das organizações. Segundo o próprio IBGC, “A governança corporativa evoluiu significativamente nos últimos anos, expandindo seu foco da otimização de valor econômico exclusivamente aos sócios para o objetivo de geração de valor compartilhado entre os sócios e as demais partes interessadas. Essa perspectiva contemporânea reconhece a interdependência entre as organizações e as realidades econômica, social e ambiental em que elas estão inseridas.”

Princípios devem guiar decisões e práticas

As recomendações específicas merecem ser lidas com atenção por quem deseja implantar ou melhorar as práticas de governança e desta maneira perenizar sua organização. Neste momento, quero me ater aos “princípios da governança corporativa”, que resumem bem as ideias principais e devem se aplicar a qualquer tipo de organização, independentemente de porte, natureza jurídica ou estrutura de capital.

  • Integridade, que foca na promoção da cultura ética, coerência entre discurso e prática e prevenção contra conflitos de interesse;
  • Transparência, que demanda disponibilizar, para as partes interessadas, informações “verdadeiras, tempestivas, coerentes, claras e relevantes, sejam elas positivas ou negativas, e não apenas aquelas exigidas por leis ou regulamentos”. Mais um motivo para ter um bom relatório de sustentabilidade.
  • Equidade, que aborda o tratamento de sócios e partes interessadas de maneira justa, levando em consideração seus direitos, deveres, necessidades, interesses, expectativas e até diferenças, promovendo ajustes conforme as relações e demandas de cada stakeholder.
  • Responsabilização (accountability), que trata de “desempenhar suas funções com diligência, independência e com vistas à geração de valor sustentável no longo prazo, assumindo a responsabilidade pelas consequências de seus atos e omissões”.
  • Sustentabilidade, que em linha com as melhores definições do tema, demanda “zelar pela viabilidade econômico-financeira da organização, reduzir as externalidades negativas de seus negócios e operações, e aumentar as positivas, levando em consideração, no seu modelo de negócios, os diversos capitais (financeiro, manufaturado, intelectual, humano, social, natural, reputacional) no curto, médio e longo prazos”.

 

A boa governança é caminho para negócios mais sustentáveis em diversos sentidos. Por permitir que estejam preparados para o longo prazo, a partir de um senso de propósito e de entrega de valor para todas as partes envolvidas com a organização, ao ser o começo das estratégias ESG,  ao envolver a alta gestão no tema (inclusive com os comitês temáticos de ESG e sustentabilidade) e conectar de forma estratégica o longo prazo com o tempo presente. Afinal, o futuro – bom ou ruim –  se faz agora.

 

Danilo Maeda é head da Beon, consultoria de ESG da FSB Holding

 

Publicada originalmente no site da Exame 

Publicado na CompliancePME em 21 de agosto de 2023