Chegamos à era da sustentabilidade na agenda dos conselhos de administração e de toda a alta liderança. O ano de 2023, sem sombra de dúvida, tem sido surpreendente.
Sustentabilidade, incluindo clima, foi assunto tratado historicamente como check the box regulatório com pouca (ou nenhuma) significância para os negócios, principalmente em países como o Brasil, onde fiscalização e penalização ainda não ocorrem. Num melhor horizonte, estava minimamente atrelada a avaliações de eficiência operacional, circunscrita aos times operacionais.
Sustentabilidade estava a quilômetros de distância da agenda da liderança, quiçá do conselho de administração. Nem mesmo a discussão sobre dever fiduciário dos administradores lato sensu era suficiente para mostrar que conselheiros e diretores estatutários tinham dever legal de avaliar riscos e oportunidades ambientais e climáticas, em prol de assegurar retorno no longo prazo.
Intrigante, para dizer o mínimo, para quem sempre leu “capital natural” como a base de sustentação da economia global, ou seja, de todo e qualquer negócio.
A escalada da sustentabilidade foi lenta, gradual e recheada de obstáculos, mas a resiliência no processo compensou: chegamos ao walk the talkExpressão idiomática que quer dizer “cumprir o que se prega"; "andar como se fala". com uma combinação interessante de atualização de boas práticas com tomada efetiva de ação.
Em agosto de 2023, o Instituto Brasileiro de Governança CorporativaÉ o sistema pelo qual as empresas e demais organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo os relacionamentos entre sócios, conselho de administração, diretoria, órgãos de fiscalização e controle e... (IBGC) lançou a versão atualizada do Código de Melhores Práticas de Governança Corporativa, alçando a sustentabilidade a um princípio da governança corporativa no Brasil. Passou a ser foco do conselho de administração para criar valor de longo prazo, assegurando o cumprimento do propósito do negócio.
Em junho de 2023, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE(OCDE): no combate mundial à corrupção, a OCDE desempenhou papel importante pois seus Estados membros firmaram a Convenção sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais...) também publicou a versão atualizada das suas recomendações para Princípios de Governança Corporativa, trazendo a sustentabilidade entre eles.
Para a OCDE, sustentabilidade é a base para identificar e responder ao anseio dos investidores e demais stakeholdersPessoas ou grupos de pessoas com algum grau de envolvimento ou interesse em uma organização ou entidade, tais como empregados, clientes, fornecedores ou cidadãos que podem ser afetados por determinada... e para contribuir com o sucesso do negócio no longo prazo, cabendo ao conselho de administração assegurar que temas materiais de sustentabilidade sejam considerados na gestão de riscoModelo de gestão que visa minimizar detectar todos os possíveis riscos de perdas dentro de uma empresa, tanto tangíveis, quanto intangíveis..
E a OCDE vai além. Afirma ser necessário assegurar que dados materiais relativos à sustentabilidade sejam divulgados de forma confiável, consistente e comparável, incluindo políticas e métricas de performance. Para a OCDE, indicadores de sustentabilidade na remuneração dos executivos podem validar dados divulgados, permitindo aos investidores identificar se os indicadores estão relacionados a riscos materiais e oportunidades e incentivando a visão de longo prazo.
Se ainda existiam dúvidas sobre a abrangência do dever fiduciário no contexto atual do mundo, elas acabaram. Conselheiros e estatutários, os administradores lato sensu, têm o dever de avaliar riscos e oportunidades relacionados aos temas de sustentabilidade materiais ao negócio no desempenho de suas funções.
Mesmo sendo evidente e incontestável a relação de dependência da economia com sustentabilidade em 2023, mesmo sendo evidente que a avaliação de riscosAvaliar a probabilidade e a severidade do dano. Probalidade x Impacto. Normalmente são avaliados em: baixo, médio, alto. e oportunidades de sustentabilidade seja dever da liderança e mesmo tendo até a governança corporativa “raiz” se rendido à relevância da sustentabilidade, como bons brasileiros, ficaria a pergunta: e isso tudo sai do papel?
A boa notícia é que está saindo. Em muitas empresas, a alta liderança está efetivamente engajada nos temas de sustentabilidade materiais ao seu negócio.
Conselhos de administração têm se capacitado no tema, reservado agenda, e têm sido proativos nas demandas de sustentabilidade discutidas com os executivos do negócio. Comitês de assessoramento, a exemplo de comitês de auditoriaÉ um processo de verificação e análise de atividades desenvolvidas por uma determinada empresa. O seu objetivo principal é examinar se elas estão de acordo com o que foi planejado..., passam a avaliar a validade, coerência e consistência dos dados de sustentabilidade divulgados ao mercado vis a vis seus dados financeiros.
A liderança executiva está avaliando riscos de sustentabilidade nas perspectivas de probabilidade, impacto e de cenários futuros estimados, assim como está avaliando as oportunidades e assegurando o investimento devido. É possível ver muitos casos em que compromissos vazios deram lugar aos concretos, com planos de ação transparentes, execução em tempo real e metas intermediárias divulgadas.
Hoje, a sustentabilidade integra o planejamento estratégico de parcela relevante dos negócios. É o novo modo (real) de fazer negócios. Viva!
Publicada originalmente no site CapitalReset