Na última década, as empresas de infraestrutura no Brasil, especificamente as de construção pesada, mudaram sua configuração, adotando processos estruturados em governança, transparência, monitoramento, controle e responsabilização, em todos os níveis. Intensificado pelos resultados da operação Lava Jato, passou de conjunto de ações reativas para um movimento proativo.

A Bússola conversou com Tatiane Ollé, Diretora Jurídica e Gestora de Conformidade do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada (Sinicon), sobre como as instituições do setor vêm estruturando políticas preventivas e reativas de sistemas de compliance e sobre como essas ações podem ampliar as oportunidades de negócios.

Bússola: A cultura da integridade e da gestão de riscos vem crescendo, assim como a necessidade de maior transparência e medidas de controle. Como o Sinicon vê essa tendência?

Tatiane Ollé: Esse é um movimento sem volta. As instituições precisam estar alinhadas para que possam conquistar e manter sua condição de operar em países que exigem transparência e integridade. No Brasil, esse movimento foi intensificado com os resultados da operação Lava Jato, que atingiram particularmente empresas da indústria de construção pesada.

A transformação ocorrida no setor, com a promoção de uma cultura de integridade e gestão de riscos, foi evoluindo de uma motivação reativa para uma ação proativa. Essa evolução se consolida e se fortalece a cada dia com a constatação de que um ambiente negocial mais íntegro e transparente é bom para todos, pois reduz custos para a sociedade, mitiga riscos e adiciona valor aos negócios.

Bússola Exame: O que defende, de fato, o Conselho de Ética do Sinicon e que empresas participam dele?

Tatiane Ollé: No atual mandato, estão representadas no conselho as empresas Andrade Gutierrez, Camargo Correa Infra, Ferreira Guedes, Galvão, Queiroz Galvão e OEC. O conselho apoia o Sinicon na definição de políticas e práticas internas de integridade que orientam seus dirigentes e colaboradores, além de ser um foro de discussão em matérias de integridade e compliance, buscando formas de ampliar e difundir essas práticas em toda a indústria de construção pesada.

Bússola Exame: O setor de infraestrutura no Brasil sofreu o maior baque de sua história com os esquemas de corrupção denunciados pela operação Lava Jato, em 2015. As maiores empresas do setor precisaram recorrer a acordos com a justiça para sobreviver, acumularam dívidas bilionárias e mancharam sua imagem por anos. Com isso, todo o país sofreu impactos, com redução de obras, investimentos e oportunidades. O que mudou ao longo desses anos?

Tatiane Ollé: Nesses últimos anos, o setor da construção civil se fortaleceu nos quesitos da ética e da integridade. A evolução dos programas de compliance aumentou os controles e implementou novas rotinas, capazes de revolucionar e fortalecer a cultura de integridade, que a cada dia se torna mais enraizada.

Desta forma, o mercado amadureceu com os fatos ocorridos no passado, fazendo com que as áreas de compliance sejam cada vez mais um ativo empresarial e funcionem como uma condição de sobrevivência. A tolerância zero para corrupção edifica o setor, que por meio de iniciativas coletivas e individuais, contribui para o aumento da confiança e, consequentemente, da oferta de novas oportunidades de negócio.

Bússola: Podemos dizer que há um amadurecimento de gestão nas empresas do setor?

Tatiane Ollé: As companhias vêm se transformando. Se olharmos para empresas grandes, que se relacionam principalmente com clientes privados, a evolução de práticas de compliance foi bastante acelerada. Essas empresas investiram em sistemas integrados, equipes qualificadas e também em governança corporativa. Mas acreditamos que há um longo espaço para melhoria da gestão de compliance em empresas menores. Esse processo requer tempo e será fundamental que grandes contratantes e empresas líderes do setor ajudem e estimulem empresas menores nessa implantação.

Bússola: Ainda há espaço para crescimento na implementação de medidas de conformidade entre as organizações?

Sinicon: Nossa atividade é, por definição, muito complexa e desafiante. Execução de atividades de compliance nesse ambiente também requer muita resiliência, pois existem muitos fatores externos na realização de um empreendimento. Por essa razão, é fundamental ter ações de integridade ágeis e eficazes. O segredo é focar no que é relevante e monitorar e acompanhar os riscos e processos críticos. Uma vez que é um grande empregador, o setor pode ser um vetor de transformação cultural do Brasil.

Notícia publicada originalmente na Exame 

Publicado na CompliancePME em 23 de junho de 2021