A Lei Anticorrupção brasileira, que completa uma década neste mês de agosto, tem contribuído gradualmente para uma transformação nas operações empresariais no país. Um olhar em perspectiva aponta a promoção de uma cultura pautada pela integridade, ética e transparência. Desde sua aprovação, a legislação gerou impactos nos cenários político e econômico, que acarretaram mudanças significativas nas práticas de negócios e no ambiente regulatório.

Inspirada por normas e melhores práticas, a lei estabelece a responsabilidade objetiva das organizações por atos de corrupção, além de prever a aplicação de sanções administrativas, como multas e suspensão de contratos governamentais. Adicionalmente, incentiva a adoção de processos internos de compliance e, principalmente, do Programa de Integridade, que assegura que as atividades empresariais estejam em conformidade com regulamentações, normas internas e padrões éticos pertinentes.

Este cenário transformou em pauta incontornável o compliance – termo que define o estado de conformidade interna com práticas, normas e controles, especialmente externos. O compliance apoia decisivamente a gestão dos negócios. Ainda há, claro, um bom caminho a percorrer para que empresas estruturem e incorporem seus programas na área de maneira alinhada à estratégia. Contudo, já é perceptível um amadurecimento, evidenciado pela implementação de tecnologias em prol da gestão da cultura ética e pela criação de canais que auxiliam na elaboração de relatórios, apresentando resultados concretos em várias esferas.

Um histórico de avanços
É possível observar os avanços neste sentido a partir dos resultados do estudo “Integridade Corporativa no Brasil”, elaborado pela Deloitte em colaboração com o Pacto Global da ONU no Brasil. A maior parte (88%) das empresas participantes da pesquisa afirma ter alguma estrutura para liderar o compliance. Dentro desse grupo, 37% têm uma área específica de compliance e, em 17%, a liderança do tema está a cargo das áreas de gestão de riscos e controles internos.

Maior compliance leva a resultados melhores. De acordo com a pesquisa, mais da metade (52%) das empresas que contam com uma área de compliance dizem que a estrutura contribuiu para aprimorar resultados financeiros. A contribuição é considerada significativa em 37% delas. Maior compliance leva, também, a relações mais sólidas com stakeholders. A frequência com que a área responsável se reporta aos órgãos de governança aumentou, sinalizando um reforço na importância da conformidade nas organizações, de acordo com a pesquisa.

Nota-se ainda que as empresas têm implantado frentes diversas e simultâneas de atuação – complexidade que só contribui para a eficiência dos controles. Ainda segundo o estudo, as práticas mais implementadas, considerando o período de 2022 a 2024, são ou devem ser: desenvolvimento de código de ética e conduta (75%), comprometimento concreto da alta administração (74%), avaliação de riscos na cadeia de fornecedores (73%), canal independente para denúncias anônimas (73%) e treinamentos sobre integridade corporativa e práticas anticorrupção (73%).

Mais desafios no horizonte
Obviamente, há desafios importantes a enfrentar, como uma aplicação mais decisiva de tecnologia para o monitoramento, compreensão do panorama de riscos e estabelecimento de uma gestão eficiente de terceiros. Outras jornadas a empreender são: a estruturação e integração entre programas de Integridade, de forma a garantir maior alinhamento com a estratégia do negócio; o uso de tecnologias emergentes para obter maior eficácia; e atender às principais regulamentações de maneira robusta. Certamente, os resultados da última década devem servir de inspiração às organizações para o enfrentamento desses desafios nos próximos anos.

Afinal, a Lei Anticorrupção enfatizou a importância do compliance não só como obrigação legal, mas como componente fundamental para a maturidade organizacional. Permitiu aos negócios comprometerem-se para que suas operações ocorram com ética e em conformidade com leis e regulamentações, permitindo estabelecer bases sólidas, longevas e confiáveis para o crescimento sustentável frente a todos os stakeholders.

Alex Borges é sócio de Risk Advisory e líder de Risco Regulatório da Deloitte.

Publicada originalmente no site Monitor Mercantil

Publicado na CompliancePME em 1 de setembro de 2023