Bernardo Viana, Especialista em Compliance. Professor na Fundação de Getulio Vargas (FGV) e na Legal, Ethics & Compliance (LEC). Co-fundador do Instituto Rio Compliance, Membro da Comissão de Estudos Permanentes de Compliance do Instituto dos Advogados de São Paulo (IASP) e Sócio do escritório Almeida Advogados. Representa companhias mencionadas na Lava Jato

 Matheus Leone Rodrigues Santos, Trainee do escritório Almeida Advogados

Apesar de caminhar inteiro sob a pandemia, o ano de 2021 tem sido bastante agitado para temas como Combate à Corrupção e Prevenção à Lavagem de Dinheiro, ao Financiamento do Terrorismo e à Proliferação de Armas de Destruição em Massa (PLD-FTP). A pandemia não impediu as principais autoridades em ambos os temas de agirem, tanto na produção de novas normas e diretrizes, quanto na atuação direta com fiscalizações e investigações.

Temos dois grandes destaques: (1) a cada vez maior consolidação da Controladoria-Geral da União (CGU) como principal força-motriz de combate à corrupção corporativa e fortalecimento de Programas de Compliance, e (2) o recrudescimento das normas de PLD-FTP, com a natural crescente expectativa dos mercados bancário e financeiro sobre como será a fiscalização.

A CGU, capacitada tecnicamente e já aproveitando os mais de sete anos de vigência da Lei Anticorrupção, celebrou 5 acordos de leniência neste ano. Aproximadamente R$ 1,8 bilhões serão recuperados com base na atuação da CGU via cooperação corporativa, e a atuação de seus quadros é bem-vista como extremamente técnica pelo mercado privado.

Os setores variam: navegação, eletrônica, petróleo e gás, sistemas de informação, saúde, construção e outros. Tal qual esperado, apesar da preocupação em torno dos possíveis efeitos negativos da extinção formal da força-tarefa da Operação Lava Jato, não houve redução dos investimentos corporativos em compliance para maior prevenção, controles internos e investigações internas. Ao contrário, cada vez mais baseados em incentivos positivos e no valor que tais esforços agregam, continuam a crescer.

Como parte do Plano Anual Anticorrupção [1], a CGU tem oferecido pareceres em Projetos de Lei que visam fortalecer a prevenção e o combate à corrupção, bem como propôs seus próprios decretos para regulamentar o lobby, expandir medidas de proteção a denunciantes, e promover melhorias nos processos de identificação de conflitos de interesse por agentes públicos. Além disso, neste mês de dezembro tivemos o resultado do Pró-Ética 2020-2021, iniciativa criada para reconhecer as iniciativas do setor privado com selo de ética e integridade, que contou com 67 premiados nesta edição.

Instituições financeiras e o mercado de capitais também estão atentas ao avanço das obrigações de PLD-FTP graças às novas normas do COAF, Banco Central e CVM, sem contar as novas regulações também impostas por SUSEP e PREVIC. Desde 2019, há uma clara movimentação coordenada em linha com as diretrizes do FATF/GAFI (Financial Action Task Force) e as Ações da ENCCLA (Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro).

As exigências para as avaliações de risco e rotinas de PLD-FTP hoje têm mais nuances e são mais complexas que antes. Por exemplo, a Resolução nº 36 do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), além de disciplinar a forma de adoção de políticas, procedimentos e controles internos por parte de entidades supervisionadas pelo COAF em matéria de PLD-FTP, foi a primeira das normas publicadas nesse ano a incorporar a preocupação com a proliferação de armas de destruição, adicionando o P ao final da sigla até então referida como “PLD-FT”.

Tal mudança está em linha com resultado na publicação de resolução similar pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) [2] para alinhamento de terminologias entre autoridades nacionais.

A Resolução nº 40 do COAF atualizou a definição de Pessoas Politicamente Expostas (PEPs) de acordo com o que já era praticado pelo Banco Central, CGU e CVM, e expandiu instruções sobre consulta às bases de dados oficiais para ajudar as instituições supervisionadas a monitorarem PEPs em seus procedimentos de Know Your Client (KYC) e Know Your Third-Party (KY3P).

Além dessas, outras normas de PLD-FTP foram produzidas e atualizadas ao longo do ano. Tão importante quanto às novas obrigações, a expectativa do mercado hoje é de recrudescimento da fiscalização das rotinas de prevenção. O grande esforço de atualização e consolidação regulatória, combinado com o tom das comunicações oficiais, justificam essa leitura.

O amadurecimento das autoridades e do mercado ao tratar do tema resultará em cada vez mais interligação e atuação coordenada (como temos visto, por exemplo, nos Estados Unidos). Aguardemos, mais preparados, o que 2022 nos trará, especialmente considerando os novos desafios impostos por criptoativos e outros mercados pouco regulamentados.

Notas

[1] O Plano Anticorrupção, publicado em dezembro de 2021, é um diagnóstico das ações do Governo Federal praticadas em 2020/2021 para o combate à corrupção.

[2] Resolução CVM nº 50, publicada em 31 de agosto de 2021, que revogou a Instrução CVM nº 617/2019, vigente desde outubro de 2020, promovendo ajustes finos para auxiliar as instituições reguladas no cumprimento das normas aplicáveis, bem como alterações para adequar a nomenclatura do Programa, abarcando também a prevenção ao financiamento da proliferação de armas de destruição em massa.

Originalmente publicado no Estadão

Publicado na CompliancePME em 20 de dezembro de 2021